Advogado criminalista que atua de verdade — e não só no discurso — sabe que o ritmo é pesado. Audiências, visitas técnicas, petições urgentes, clientes desesperados a qualquer hora do dia (ou da noite)… O corpo aguenta até certo ponto, mas a mente cobra a fatura rápido. E geralmente, o primeiro sintoma é o sono bagunçado. Dormir mal se torna rotina. Acordar cansado, normal. E aí começa o ciclo vicioso: mais café, mais ansiedade, mais noites em claro.
O problema é que essa exaustão não pega leve. Ela mina o raciocínio jurídico, derruba a produtividade e afeta até o humor nas relações com clientes. Já tentou montar um recurso importante, defender alguém acusado de estelionato, com o cérebro em modo zumbi? Pois é. Não dá. E isso não é frescura — é fisiologia básica. O corpo pede descanso, o cérebro exige pausa. Mas o advogado insiste em ignorar.
Recuperar o sono de qualidade e reduzir o cansaço mental não depende de uma fórmula mágica. Mas existem práticas que funcionam — e que, quando aplicadas com constância, transformam a forma como o corpo reage ao trabalho. E não estamos falando de spa nem de férias em resort. São pequenos ajustes na rotina que fazem o cérebro entender: “ok, agora é hora de desligar”.
Nos próximos tópicos, vamos explorar essas práticas simples, mas poderosas. Coisas que qualquer advogado pode implementar hoje mesmo, sem precisar mudar de vida. Porque, no fim das contas, a advocacia exige clareza. E clareza exige descanso. Um profissional que dorme bem atua melhor, pensa melhor — e, principalmente, vive melhor.
Desconectar-se de forma gradual após o expediente
Uma das maiores armadilhas da rotina jurídica é tentar ir direto do caos para o sono. Terminou uma audiência tensa? Atendeu cliente desesperado? Discutiu estratégia com colega? E aí… deita e espera que o sono venha num passe de mágica. Só que o cérebro ainda está em modo “alerta total”. Resultado? Insônia, pensamentos acelerados, corpo travado.
O ideal é criar um ritual de desligamento. Não precisa ser longo — bastam 30 minutos. Pode ser uma caminhada leve, um banho morno, uma leitura sem relação com trabalho ou até escutar uma música tranquila. A ideia é desacelerar o sistema. Sair do modo jurídico e entrar no modo descanso. Um passo de cada vez.
Evite, nesse período, qualquer estímulo que reacenda o raciocínio jurídico. Sabe aquela mensagem de última hora sobre um caso de celular roubado? Deixa pra amanhã. O sono não é inimigo do trabalho — ele é parte dele. É no descanso que o cérebro processa ideias, organiza argumentos e renova a energia pra próxima batalha.
Controlar o uso de telas e luz azul à noite
Essa é clássica — e continua sendo ignorada. A luz azul das telas (celular, computador, TV) engana o cérebro. Ela reduz a produção de melatonina, o hormônio do sono, e mantém o corpo em estado de alerta. Resultado? Você até fecha os olhos, mas o sono não vem. Ou vem picado, leve, pouco restaurador. E acordar cansado já virou regra, né?
A recomendação é simples: reduza o uso de telas pelo menos uma hora antes de dormir. E se não for possível (porque, convenhamos, às vezes não dá), ative o modo noturno do celular, instale filtros de luz azul ou use óculos com lente amarela. São pequenos ajustes que ajudam — de verdade — a preparar o corpo para o sono.
Também vale repensar aquele hábito de revisar e-mail na cama. O problema não é só a luz, mas o conteúdo. Uma notificação sobre processo, uma dúvida de cliente, uma cobrança inesperada… tudo isso ativa o cérebro e adia o sono. E, se o cliente acha que o advogado sumiu, uma resposta mal formulada de madrugada pode só piorar a impressão.
Estabelecer horário fixo para dormir (e acordar)
O corpo gosta de rotina. E quando falamos em sono, isso faz ainda mais diferença. Dormir em horários aleatórios bagunça o ritmo circadiano — aquele ciclo natural que regula sono, fome, disposição. E não adianta dormir 4h hoje e 10h amanhã tentando compensar. O que recarrega mesmo é a constância, não a quantidade isolada.
Tente estabelecer um horário fixo para dormir e outro para acordar — inclusive nos fins de semana. O ideal é respeitar ao máximo esse padrão, criando uma espécie de “relógio biológico jurídico”. O cérebro aprende, com o tempo, que aquele é o momento de desligar. E isso facilita o adormecer e melhora a qualidade do sono profundo.
Se você costuma trabalhar até tarde, faça o ajuste aos poucos. Antecipe o fim do expediente em 15 minutos a cada dia. E não caia na ilusão de que precisa virar a noite revisando peça. Até porque, em casos que exigem atenção total — como pedidos urgentes de medidas protetivas —, a última coisa que o cliente precisa é de um advogado sonolento e desconcentrado.
Cuidados com alimentação e cafeína à noite
A alimentação tem impacto direto na qualidade do sono. Comer demais ou muito tarde interfere na digestão e dificulta o relaxamento do corpo. E o vilão mais clássico: cafeína. Muito advogado vive à base de café — ok, compreensível. Mas se você toma café depois das 18h e não consegue dormir… a relação é direta. A cafeína pode continuar agindo no corpo por até 6 horas.
Evite refeições pesadas à noite. Prefira alimentos leves, ricos em triptofano (banana, aveia, iogurte) ou que favorecem o relaxamento (chá de camomila, por exemplo). E deixe o café para a parte da manhã ou início da tarde. Seu sono vai agradecer — e sua mente também.
E tem mais: bebidas alcoólicas, embora causem sonolência inicial, prejudicam a qualidade do sono. O descanso é mais superficial, com menos tempo em sono profundo. E, no dia seguinte, o cansaço volta dobrado. Se você precisa estar inteiro — especialmente em uma sustentação oral ou em um processo de Habeas Corpus —, vale mais uma noite bem dormida do que duas taças de vinho.
Incluir pausas ao longo do expediente
Advogado que trabalha sem pausa tem sono agitado. O corpo chega na cama exausto, mas a mente continua rodando. É como se o dia nunca tivesse terminado. E isso afeta o relaxamento real. Fazer pequenas pausas ao longo do expediente ajuda a reduzir essa sobrecarga mental. É como se o cérebro fosse recebendo doses de descanso, em vez de carregar tudo de uma vez pra descarregar à noite.
Essas pausas não precisam ser longas. Cinco minutos de respiração consciente, um alongamento rápido, um chá longe da tela… tudo isso já conta. A ideia é criar microdesligamentos ao longo do dia, pra evitar que o cansaço se acumule até virar colapso. Simples e eficaz.
E claro: respeite os limites do corpo. Tem dia que o rendimento cai — e tudo bem. Insistir em produzir sem parar, com dor de cabeça, com os olhos ardendo, com o corpo tenso… é receita pra burnout. E quando o colapso chega, o sono desaparece de vez. Não vale a pena. Nenhum cliente — por mais grave que seja o caso — quer um profissional no limite físico e emocional.
Evitar revisar processos na cama
A cama deve ser espaço de descanso, não de trabalho. Mas muitos advogados têm o hábito de revisar peças, reler jurisprudências ou responder clientes já deitados, achando que estão sendo produtivos. Só que, para o cérebro, isso cria uma associação perigosa: cama = trabalho. E aí, quando você tenta dormir, o cérebro continua trabalhando. Resultado? Sono leve, interrompido e nada restaurador.
Se precisar estudar à noite, faça isso na escrivaninha. Use a cama apenas para dormir ou relaxar. E, na medida do possível, estabeleça um “toque de recolher” jurídico: depois de tal hora, nada mais de petição, grupo da OAB ou monitoramento do andamento processual.
Manter esse limite é essencial para proteger sua saúde mental. E se você vive com aquela sensação de que precisa estar disponível 24h — saiba que isso não é bom nem para você, nem para o cliente. Um profissional descansado é mais assertivo, mais estratégico, mais presente. E, no fim, esse é o tipo de advogado que o cliente realmente quer — mesmo que ele nunca diga em voz alta.